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Fundo para captura, armazenamento e uso de carbono

por Leonardo Estrela Borges

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EDIÇÃO 29 - SETEMBRO 2024
imagem da floresta amazônica e símbolos de gás carbônico

 

Projeto para criar o Fundo de Responsabilidade de Longo Prazo em Atividades de Captura, Armazenamento e Uso de Carbono. Proposta generalista, com necessidade de regulamentação posterior. Possíveis inconstitucionalidades.

I- Contexto

1- Trata-se de análise jurídica ao Projeto de Lei 2.491/2024 (PL), que dispõe sobre a criação do Fundo de Responsabilidade de Longo Prazo em Atividades de Captura, Armazenamento e Uso de Carbono (CCUS), com a finalidade de constituir reserva financeira destinada a enfrentar situações de acidentes ambientais decorrentes dessas atividades, bem como disciplina a responsabilidade civil do operador de atividades de captura e estocagem de carbono.

 

2- Na justificação, alega-se:

- Institui o a importância da captura, do uso e do armazenamento de carbono como tecnologia emergente para a redução das emissões de gases de efeito estufa é incontestável. Estas atividades são cruciais para atingir as metas de descarbonização globais e nacionais, contribuindo significativamente para o combate às mudanças climáticas. No entanto, tais tecnologias, embora promissoras, trazem consigo riscos e incertezas, especialmente no que se refere a possíveis acidentes ambientais que podem surgir da manipulação e armazenamento de grandes volumes de CO2. A criação de um Fundo de Responsabilidade de Longo Prazo visa endereçar esses riscos de maneira proativa, constituindo uma reserva financeira específica para cobrir custos associados a acidentes ambientais em atividades de CCUS. Isso não apenas assegura um mecanismo de resposta rápida e eficiente para mitigar impactos ambientais adversos, mas também transmite uma mensagem clara de comprometimento com a responsabilidade ambiental e social.

 

II- Análise

II.I- Aspectos formais

 

3- Não há impedimentos constitucionais formais à proposta, pois a matéria não se sujeita à iniciativa privativa da Presidência da República (CF, art. 61).

 

II.II- Aspectos materiais

 

4- No mérito, a norma cria um fundo, mas como se trata de medida tipicamente executiva, remete praticamente toda a sua estruturação à regulamentação posterior. Há, portanto, ambiente de incerteza em relação ao que será, de fato, tal fundo.

 

5- Os dispositivos iniciais são generalistas e precisam de regulamentação posterior para a sua plena execução (arts. 1º a 5º).

 

6- O art. 6º estabelece as fontes de financiamento do CCUS, e dispositivos semelhantes em outras normas já foram vetados pelo Executivo Federal, com base nos seguintes argumentos:

A proposição legislativa prevê que seria destinada parcela das arrecadações de recursos financeiros advindos do pagamento de multas por crimes e infrações ambientais e de acordos judiciais e extrajudiciais de reparação de danos socioambientais para o Fundo Nacional para Calamidades Públicas, Proteção e Defesa Civil (Funcap), estabelecendo que constituiria recurso do Funcap parcela dos recursos advindos de acordos judiciais e extrajudiciais de reparação de danos socioambientais, sendo-lhe destinados cinco por cento da parcela que coubesse à União quanto a esses recursos.

Contudo, apesar de meritória a intenção do legislador, a proposição legislativa incorre em vício de inconstitucionalidade, ao criar obrigação de destinação para o Funcap, em afronta ao disposto no § 3º do art. 225 da Constituição, o que afetaria negativamente ações oriundas das obrigações de fazer, não fazer e indenizar estabelecidas por meio dos acordos judiciais ou extrajudiciais de reparação de danos socioambientais, comprometendo a integralidade dos objetivos públicos a serem alcançados por meio desses acordos.

Ademais, a medida contraria o interesse público, pois o texto proposto cria vinculação de receitas, contrariando o disposto no art. 141 da Lei nº 14.436, de 9 de agosto de 2022 - Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2023.

 

6.1- Há, portanto, possível inconstitucionalidade no artigo em questão.

 

7- O artigo 7º é de duvidosa constitucionalidade, uma vez que o STF decidiu que danos ambientais são imprescritíveis, conforme Tema 999:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 999. CONSTITUCIONAL. DANO AMBIENTAL. REPARAÇÃO. IMPRESCRITIBILIDADE.

1. Debate-se nestes autos se deve prevalecer o princípio da segurança jurídica, que beneficia o autor do dano ambiental diante da inércia do Poder Público; ou se devem prevalecer os princípios constitucionais de proteção, preservação e reparação do meio ambiente, que beneficiam toda a coletividade.

2. Em nosso ordenamento jurídico, a regra é a prescrição da pretensão reparatória. A imprescritibilidade, por sua vez, é exceção. Depende, portanto, de fatores externos, que o ordenamento jurídico reputa inderrogáveis pelo tempo.

3. Embora a Constituição e as leis ordinárias não disponham acerca do prazo prescricional para a reparação de danos civis ambientais, sendo regra a estipulação de prazo para pretensão ressarcitória, a tutela constitucional a determinados valores impõe o reconhecimento de pretensões imprescritíveis.

4. O meio ambiente deve ser considerado patrimônio comum de toda humanidade, para a garantia de sua integral proteção, especialmente em relação às gerações futuras. Todas as condutas do Poder Público estatal devem ser direcionadas no sentido de integral proteção legislativa interna e de adesão aos pactos e tratados internacionais protetivos desse direito humano fundamental de 3ª geração, para evitar prejuízo da coletividade em face de uma afetação de certo bem (recurso natural) a uma finalidade individual.

5. A reparação do dano ao meio ambiente é direito fundamental indisponível, sendo imperativo o reconhecimento da imprescritibilidade no que toca à recomposição dos danos ambientais.

6. Extinção do processo, com julgamento de mérito, em relação ao Espólio de Orleir Messias Cameli e a Marmud Cameli Ltda, com base no art. 487, III, b do Código de Processo Civil de 2015, ficando prejudicado o Recurso Extraordinário. Afirmação de tese segundo a qual É imprescritível a pretensão de reparação civil de dano ambiental.

 

8- Por fim, o artigo 8º exige a contratação de seguro ambiental para o desempenho de atividades pertencentes a cadeias de serviço de captura e estocagem de carbono, o que pode dificultá-las, ou até mesmo inviabilizá-las. É preciso consultar os setores interessados acerca da conveniência fática (se há seguradoras que oferecem tal serviço) e, sobretudo, financeira da medida. Corre-se o risco de onerar de modo desproporcional tais atividades.

 

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Leonardo Estrela Borges é advogado na CNI.

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