O Supremo e a indústria em 2023
por Cassio Borges
EDIÇÃO 26 - DEZEMBRO 2023
Faz algum tempo que o Poder Público vem adotando iniciativas para desafogar a Justiça, a exemplo da reforma do Judiciário, da informatização do processo judicial, da criação do plenário virtual e da modernização do Código de Processo Civil.
Algumas dessas iniciativas foram construídas para surtir efeitos a longo prazo; outras, imediatamente, a exemplo do plenário virtual no STF. Adotado em 2007 apenas para decidir a repercussão geral de recursos extraordinários, foi sendo ampliado e, em 2020, impulsionado pela necessidade de adaptações em decorrência da pandemia, foi equiparado regimentalmente ao plenário presencial.
Segundo o portal Corte Aberta, do próprio STF, em 2007 apenas 0,1% das decisões do Tribunal eram adotadas no plenário virtual. Esse número se inverteu e atualmente o Supremo julga 99,5% dos casos virtualmente.
A ampliação das hipóteses de julgamento virtual permitiu que o acervo do STF baixasse de 150 mil processos ativos em 2006 para 27 mil em 2023, reduzindo a idade média das ações julgadas de quase quatro anos em 2006 para 7 meses atualmente.
Na classe das ações de controle concentrado (ação direta de inconstitucionalidade - ADI, ação declaratória de constitucionalidade - ADC, ação direta de inconstitucionalidade por omissão - ADO e arguição de descumprimento de preceito fundamental - ADPF), essa redução não foi tão drástica: as ADIs julgadas em 2006, por exemplo, tinham em média 7 anos e 3 meses de tramitação, e, em 2022, 5 anos e 5 meses – embora o número dessas ações julgadas em um ano e outro tenha dobrado, de 224 para 490.
Essas evoluções foram percebidas pela CNI, motivando a inauguração de uma nova forma de se relacionar com o Supremo e de defender os interesses da categoria industrial.
Lançada em 2016 e publicada anualmente, a Agenda Jurídica da Indústria STF contém ações de autoria da CNI, ações que atua como amicus curiae e outras que monitora de perto, com o propósito de demonstrar à Corte e à sociedade quais são as principais ações de interesse da indústria em tramitação no STF.
Das ações listadas na Agenda de 2023, o Tribunal deu baixa em 25 e julgou outras 14, que ainda pendem de atos processuais específicos para serem encerradas.
Deste rol alguns julgamentos merecem destaque.
Em março foram julgados a ADI 4.905, de autoria da CNI, e o RE 796.939, em que a Confederação atuava como amicus curiae. As ações discutiam a constitucionalidade das multas aplicadas pela Receita Federal no mero indeferimento de pedidos de restituição ou compensação de tributos.
Em alinhamento com os argumentos trazidos pela CNI, o STF concluiu que esses pedidos são direitos subjetivos dos contribuintes, não se subordinando à apreciação de conveniência e oportunidade da administração tributária.
A CNI atuou como amicus curiae nessa ação, defendendo a tese que acabou sendo acolhida pelo Supremo, reconhecendo que “o parcelamento e o pagamento integral dos créditos tributários, além de resultarem em incremento da arrecadação, exercendo inequívoca função reparatória do dano causado ao erário pela prática dos crimes tributários, funcionam como mecanismos de fomento da atividade econômica e, em consequência, de preservação e geração de empregos.”
Em outra seara, vale destacar o julgamento da ADC 39, que buscava a declaração de constitucionalidade do Decreto 2.100/1996, denunciando a Convenção OIT nº 158, que definia as hipóteses que autorizam o término da relação de trabalho.
O STF firmou entendimento de que “a denúncia pelo Presidente da República de tratados internacionais aprovados pelo Congresso Nacional, para que produza efeitos no ordenamento jurídico interno, não prescinde da sua aprovação pelo Congresso”.
O que mais importa destacar deste julgamento, na visão da CNI, que atuou como amicus curiae, é que restou decidido que tal entendimento será aplicado somente a partir da publicação da ata do julgamento (22/6/2023), mantendo-se a eficácia das denúncias realizadas até esse marco temporal.
Dessa forma, o STF manteve a validade daquela denúncia feita pelo então Presidente da República Fernando Henrique Cardoso. Mais do que isso, afastou qualquer dúvida que poderia haver sobre eventuais restrições às dispensas injustificadas de emprego.
Um último destaque dentre as ações encerradas pelo STF em 2023 é a ADI 5.994, que reconheceu como constitucional a jornada de 12 x 36 horas por meio de acordo individual de trabalho, bem como o pagamento, em uma única parcela, do descanso semanal remunerado, da prorrogação do trabalho noturno e do labor em feriados. A decisão coincide com o que a CNI defendia na ação, como amicus curae.
2023 foi mais um ano em que o Supremo apresentou alta produtividade, com resultados positivos para a sociedade. A expectativa da CNI é que no próximo ano o Tribunal consiga dar continuidade a esta evolução dos julgamentos, contribuindo para que o Direito se transforme em ferramenta de orientação e proteção social.
Neste sentido, a CNI contribuirá indicando, por meio da Agenda Jurídica que será lançada no início de 2024, uma relação de ações cujos julgamentos permitirão a construção de um ambiente propício ao desenvolvimento sustentável do país e ao bem-estar da sociedade.
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Cassio Borges é diretor jurídico da CNI