Melhoria das práticas regulamentares do Poder Executivo Federal
Por Christina Aires Correa Lima de Siqueira Dias
EDIÇÃO 24 - SETEMBRO 2023
PL 2.646/2020 - Permite a criação de debêntures de infraestrutura - Expansão segundo o princípio do desenvolvimento sustentável - Investimentos para combater a crise COVID-19 - Demanda permanente do setor produtivo por investimento em infraestrutura - Apoio da CNI.
1. Proposta que dispõe sobre a adoção pelo Poder Executivo Federal de procedimentos periódicos de guilhotina de, a fim de simplificar a legislação, eliminar ambiguidades das normas regulamentadoras, reduzir a judicialização e aperfeiçoar o ambiente de negócio. 2. Não há inconstitucionalidade na proposta como um todo, que tem amparo no artigo 59, parágrafo único da Carta e é meritória, pois apesar de várias agências como a Anvisa e a Anatel já virem promovendo guilhotinas regulatórias periódicas, essa é uma boa prática que deve ser estendida para toda a administração pública, por contribuir para a melhoria do ambiente de negócios e a segurança jurídica. 3. Pelo apoio, com a emenda sugerida no corpo do parecer.
I- Contexto
1.1- Trata-se de análise jurídica do Projeto de Lei (PLP) 102/2021, que acrescenta à Lei Complementar (LC) 95/1998 uma sessão para dispor sobre a adoção pelo Poder Executivo Federal de procedimentos periódicos de guilhotina de, a fim de simplificar a legislação, eliminar ambiguidades das normas regulamentadoras, reduzir a judicialização e aperfeiçoar o ambiente de negócio.
1.2- Eis o resumo do Projeto:
a) Prevê a adoção, pelo Poder Executivo Federal, de procedimentos periódicos de guilhotina, a fim de simplificar a legislação, eliminar ambiguidades de normas regulamentadoras, reduzir a judicialização e aperfeiçoar o ambiente de negócio;
b) Estabelece os princípios da guilhotina regulamentar, para definir que as normas infralegais devem se ater ao estritamente necessário, para aumentar a segurança jurídica na sua aplicação;
c) Determina que autoridades públicas deverão editar, em até 30 dias, atos normativos de caráter vinculante em relação ao órgão ou entidade a que se destinam, para uniformizar, até ulterior revisão, a aplicação das decisões definitivas do STF e STJ com eficácia vinculante;
d) Estabelece a periodicidade de execução da guilhotina regulamentar, tornando obrigatória sua realização pelo menos no primeiro ano de cada mandato do Chefe do Poder Executivo.
II- Análise
II.I- ASPECTOS FORMAIS
2.1- Sob o ponto de vista do processo legislativo constitucional, não há óbice à atuação parlamentar inicial no caso, pois a matéria não se sujeita à iniciativa privativa (CF, Art. 61 e § 1º).
2.2- Também resta cumprida a exigência de lei complementar para dispor sobre a elaboração, redação, alteração e consolidação das leis, prevista no parágrafo único do artigo 59, da Constituição.
II.II- ASPECTOS MATERIAIS
3- A proposta merece apoio por buscar melhorar o ambiente de negócios e conferir maior segurança jurídica aos empreendedores, ao estabelecer a obrigatoriedade de o Poder Executivo realizar o procedimento de guilhotina regulamentar, assim definido no artigo 17-A do PLP:
17-A. Os órgãos do Poder Executivo Federal deverão promover periodicamente rotinas de guilhotina regulamentar, que consistem em um conjunto de iniciativas para simplificar a legislação vigente, eliminar ambiguidades das normas regulamentadoras, reduzir a judicialização e aperfeiçoar o ambiente de negócio.
4- Entre os princípios da guilhotina regulamentar, estão a elaboração das normas infralegais com base na legislação existente, com clareza e objetividade, sendo automaticamente nulas as que estiverem em desacordo; a resolução de ambiguidades em benefício dos cidadãos; e a limitação das normas ao estritamente necessário para aumentar a segurança jurídica em sua aplicação.
5- Pela proposta, os órgãos do Poder Executivo Federal deverão buscar, no longo prazo, a consolidação de todas as normas infralegais sob sua responsabilidade em documento único, com informações claras para o cidadão e os procedimentos de guilhotina deverão ser realizados pelo menos no primeiro ano de cada mandato do chefe do Poder Executivo, com necessidade de prestação de contas anual.
6- O autor entende que a proposta pode melhorar o ambiente de negócios para os empreendedores brasileiros, que hoje lidam com entraves burocráticos e de infraestrutura para poder gerar renda e emprego no País. Cita um estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação pelo qual o Brasil edita, por dia útil, uma média de 776 normas que regem a vida dos cidadãos. A estimativa de normas a serem seguidas pelas empresas alcançaria mais de 4.200 e as obriga a gastar cerca de R$ 150 bilhões por ano para manter o corpo de profissional, sistemas de tecnologia e equipamentos para cumprir todas as exigências, e conclui:
O País é um dos piores colocados [em ranking internacional], por exemplo, com relação ao tempo para pagar tributos. Em função de uma legislação esparsa, complexa, que gera elevada judicialização e grande incerteza para os empresários, o tempo médio de pagamento de impostos por ano supera as 1.500 horas.
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Não é por outro motivo que a economia brasileira perdeu o vigor desde a década de 80 e que a produtividade total vem caindo com relação a outros países como China, Coréia e Indonésia.
7- Não há inconstitucionalidade na proposta como um todo, que tem amparo no artigo 59, parágrafo único da Carta e é meritória, pois apesar de várias agências como a Anvisa e a Anatel já virem promovendo guilhotinas regulatórias periódicas, essa é uma boa prática que deve ser estendida para toda a administração pública, por contribuir para a melhoria do ambiente de negócios e a segurança jurídica, como destacado pelo autor.
8- O único ponto que pode enfrentar opiniões divergentes do ponto de vista jurídico-constitucional é a previsão do § 1º, do inciso I, do art. 17-A, verbis:
17-A ...................................................
§ 1º São princípios da guilhotina regulamentar:
I – A elaboração das normas infralegais sempre será baseada na legislação existente sendo automaticamente nulas de pleno direito aquelas que estiverem em desacordo com a Legislação e os atos que decorram dessa desconformidade;
9- Isso porque, a desconformidade da norma infralegal com a lei precisa ser expressamente declarada, seja em processo judicial no qual se declare a ilegalidade ou inconstitucionalidade dos atos, seja pelo Congresso Nacional, na forma do art. 49, V da CF, para sustar o ato que exorbite do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa; ou pela própria Administração Pública, na forma da Súmula 473/STF, pela qual:
A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se original direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.
10- Nesse sentido, poder-se-ia discutir uma emenda de redação para o termo “automaticamente”, que, como dito acima, pode enfrentar resistências daqueles que defendem o sistema de aferição formal da legalidade da norma, por um poder competente. O princípio de que as normas infralegais em desacordo com a legislação são nulas, apenas explicita o que já é assente no sistema jurídico nacional, mas pode ser mantido como reforço para os agentes públicos.
III- Conclusão
11- Não há inconstitucionalidade na proposta como um todo, que tem amparo no artigo 59, parágrafo único da Carta e é meritória, pois apesar de várias agências como a Anvisa e a Anatel já virem promovendo guilhotinas regulatórias periódicas, essa é uma boa prática que deve ser estendida para toda a administração pública, por contribuir para a melhoria do ambiente de negócios e a segurança jurídica.
12- Pelo exposto, opinamos pelo apoio ao PLP.
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Christina Aires Correa Lima de Siqueira Dias é advogada da CNI