O fim do backlog de patentes se aproxima?
por Artur Henrique Tunes Sacco
EDIÇÃO 16 - DEZEMBRO 2021
Apesar de todas as dificuldades impostas pela pandemia da COVID-19, o ano de 2021 traz alguma esperança, ao menos, para a propriedade industrial brasileira. Decisões judiciais e legislativas recentes forjaram um ambiente capaz de favorecer a inovação e de atrair investimentos para o Brasil.
Em maio deste ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5529, pela qual se questionava a constitucionalidade do parágrafo único do art. 40 da Lei n.º 9.279/1996 (LPI).
No entender da maioria dos ministros, o parágrafo único do art. 40 da LPI, que teria sido instituído com o objetivo de compensar o acúmulo de pedidos de patentes (backlog) no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), é desarrazoado sob diversos aspectos, além de tornar o prazo de vigência das patentes indeterminado.
A Suprema Corte entendeu que, estando vigente o parágrafo único do art. 40, o prazo entre o depósito e a concessão de uma patente sempre será indeterminado, com ou sem backlog no INPI, visto que o tempo de processamento de patentes é um elemento indeterminado.
Partindo de tal premissa, o julgado seguiu no sentido de que a norma questionada acaba por retroalimentar o backlog, contribuindo para gerar o fenômeno que ela busca contornar, em direta afronta aos princípios da razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII, CF) e da eficiência administrativa (art. 37, caput, CF).
Muito em razão de um argumento de reforço suscitado pelo relator, o ministro Dias Toffoli, foi dirigido apelo aos gestores públicos do INPI, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, para que envidem esforços na busca por soluções desse problema crônico, que é o acúmulo do número de depósito de patentes para análise.
Num verdadeiro diálogo institucional, a Suprema Corte recomendou ao INPI a contratação de servidores, a implementação de modernização tecnológica, a normatização de procedimentos técnicos para otimizar a análise de patentes, o cumprimento das metas do Plano de Combate ao Backlog de Patentes de 2019, além de ampla transparência na análise de pedidos concedidos e em análise.
E a justificativa dos ministros para agirem assim se pautou no fato de que a demora no tempo de exame das patentes é uma realidade que precisa ser combatida, para se garantir segurança jurídica a todos os agentes do mercado.
Poucos meses depois, precisamente no mês de agosto, foi publicada a Lei n.º 14.195, conhecida como Lei da Melhoria do Ambiente de Negócios no Brasil. Entre outras medidas, o seu art. 57, inciso XXVI, revogou o art. 229-C da LPI, que condicionava a concessão de patentes para produtos e processos farmacêuticos à anuência prévia da ANVISA.
O instituto da anuência prévia jamais foi consenso e sempre desafiou críticas e debates pela doutrina, jurisprudência e setor produtivo. Diversas foram as tentativas de regular o seu procedimento. A expectativa é que a sua revogação encerre um ciclo de discussões e de disputas judiciais, conferindo mais estabilidade às relações e melhorando o ambiente de negócios.
Tanto as recomendações decorrentes do acórdão do STF quanto o fim da anuência prévia são marcos capazes de impulsionar o desenvolvimento institucional do INPI, que ainda conta com 38.955 pedidos pendentes, apesar da sensível redução desses pedidos, se comparado com o estoque apurado em setembro de 2019, no início do Plano de Combate ao Backlog de Patentes de 2019, quando existiam 147.743 pedidos pendentes.
Outro festejado acontecimento para a propriedade industrial ocorreu em novembro deste ano, no Mandado de Segurança n.º 5051373-49.2019.4.02.5101, que tramita na 13ª Vara Federal do Rio de Janeiro. Em sentença, foi reconhecida a validade das Resoluções INPI/PR n.º 240 e nº 241 de 2019, bem como das Normas de Execução SEI n.º 01, 02, 03, 04, 05 e 06 DIRPA/PR de 2019, essenciais à existência e manutenção daqueles bons números alcançados pelo Plano de Combate ao Backlog de Patentes de 2019.
As razões de decidir rebateram os argumentos de que as Resoluções INPI/PR nº 240 e 241 de 2019, ao permitirem a concessão de patentes mediante procedimento simplificado de análise, violariam a Constituição Federal e a LPI, aumentariam a litigiosidade e permitiriam a concessão de tratamento desigual para inventores nacionais e estrangeiros, violando os princípios da isonomia e da impessoalidade.
A sentença também negou razão à afirmação de que as Normas de Execução SEI nº 01 a 06 DIRPA/PR de 2019, que regulam os atos de pesquisa, análise e aprovação dos pedidos de patentes, impactariam diretamente no cálculo das gratificações dos examinadores.
O único ponto declarado inválido pelo magistrado foi a impossibilidade de realização de buscas complementares prevista na Resolução n.º 241 de 2019 do INPI. Sua Excelência, ao afastar tal impossibilidade, assegurou aos examinadores o direito de fazer tais buscas quando adequado e pertinente.
Não obstante a procedência parcial da ação, a sentença manteve a validade de todos os atos administrativos praticados pelo INPI, inclusive daqueles que observaram a parte da Resolução n.º 241 de 2019 declarada inválida, e seguirá para o Tribunal Regional Federal da 2ª Região, em remessa necessária (art. 496, CPC/2015 c/c a Lei n.º 12.016/2009, art. 14, § 1º).
Vitória, ainda que provisória, das salutares medidas decorrentes das Resoluções INPI/PR nº 240 e 241 de 2019, que otimizaram o número de decisões e contribuíram para a diminuição do estoque de pedidos no INPI.
Como legítima representante do setor industrial brasileiro, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) atuou como amicus curiae nesse processo e viu o posicionamento da categoria ser acolhido. Em linha com o previsto no seu Mapa Estratégico da Indústria 2013-2022, defendeu a diminuição do tempo de análise dos pedidos de registro de patentes, a otimização dos processos e a eficiência do INPI.
Com a plena execução do Plano de Combate ao Backlog de Patentes de 2019, com o implemento das recomendações do STF e com a confirmação da validade das Resoluções INPI/PR nº 240 e 241 de 2019, é esperado que o Brasil consiga se equiparar a países signatários do Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio (TRIPs), nos quais decisões de patentes são proferidas em até dois anos, após o pedido de exame feito pelos depositantes.
Será que o fim dessa fila de espera se aproxima?
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Artur Henrique Tunes Sacco é advogado da CNI.